sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Assalariados pagam mais IR que os bancos

Trabalhadores garantem 9,9% da arrecadação federal, mais que o dobro dos 4,1% pagos pelas instituições financeiras, aponta estudo
“As distorções tributárias do País prejudicam a classe média, que contribui com mais impostos do que os bancos. Análise feita pelo Sindicato Nacional de Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), e confirmada por especialistas, indica que os trabalhadores pagaram o equivalente a 9,9% da arrecadação federal somente com o recolhimento de Imposto de Renda ao longo de um ano. As entidades financeiras arcaram com menos da metade disso (4,1%), com o pagamento de quatro tributos.
‘Os dados mostram a opção equivocada do governo brasileiro de tributar a renda em vez da riqueza e do patrimônio’, avalia João Eloi Olinike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). A face mais nítida desta escolha, segundo o especialista, é a retenção de imposto de renda na fonte, ou seja, no salário do trabalhador.
‘São poucos os países que, como o Brasil, não deixam as empresas e as pessoas formarem riqueza’, afirmou. ‘Todos os tributaristas entendem que não está correto, era preciso tributar quem tem mais’.
(...)
Motivo. Especialistas se dividem sobre as razões para a manutenção do que chamam de distorção tributária. Segundo o advogado tributarista Robson Maia, doutor pela PUC de São Paulo e professor do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, o Brasil precisa cobrar tributos equivalentes aos de outros países, para não perder investimentos.
Na avaliação de Olenike, do IBPT, a estrutura tributária tem relação com o poder de influência de bancos e instituições financeiras. ‘Se fosse em qualquer outro país, o governo já tinha caído, mas nós não temos essa vocação, o povo é muito dócil e permite que o governo faça o que quer’.
No seu estudo sobre benefícios fiscais ao capital, o Sindifisco defende mudanças na legislação para reduzir as distorções e permitir menor pagamento de imposto por trabalhadores e maior cobrança de grandes empresas e entidades financeiras. ‘Não basta o Estado bater recordes de arrecadação de Imposto de Renda, pois quem sustenta essa estatística é a fatigada classe média’.”
Estes são alguns trechos de uma reportagem de Iuri Dantas, publicada na edição de 17 de outubro de 2011 do jornal O Estado de S. Paulo.
“Na avaliação de Olenike, do IBPT, a estrutura tributária tem relação com o poder de influência de bancos e instituições financeiras”.
Será que o poder de influência de bancos e instituições financeiras está em conformidade com o regime político que a maioria acredita que vigore neste país? Afinal, o que é democracia? Segundo os dicionários, é o regime político baseado nos princípios da soberania popular e da distribuição equitativa do poder. Portanto, democracia não se restringe ao simples “direito de ser obrigado” a votar, como a maioria acredita, e é um enorme erro julgar que pelo fato de não ser uma ditadura seja, automaticamente, uma democracia. Democracias precisam ser construídas e para tal torna-se imprescindível à participação do povo, pois elas jamais serão presenteadas pelos ditos poderosos, e esta afirmação explica o infortúnio do povo deste país.
“‘Se fosse em qualquer outro país, o governo já tinha caído, mas nós não temos essa vocação, o povo é muito dócil e permite que o governo faça o que quer.’, diz João Eloi Olinike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).”
Os brasileiros formam “um povo submisso e quase anormalmente pacífico”, diz Leslie Fry, embaixador britânico aqui acreditado nos idos de 1964, em telegrama ao Foreign Office. Duas pessoas diferentes, duas épocas diferentes, porém interpretações idênticas do comportamento deste povo, equivocadamente, classificado como heróico e que não foge à luta. E dele a parte que mais foge é, justamente, essa que a reportagem classifica como prejudicada e fatigada: a classe média. Falar sobre tal classe é assunto para um livro, mas como isto é apenas um blog, citarei apenas uma resposta dada por Maria Rita Khel, psicanalista, ensaísta, crítica literária, poetisa e cronista brasileira, em uma entrevista publicada na edição de outubro de 2011 da revista Cult.
Cult - O que impede a classe média de amadurecer politicamente?
Maria Rita Kehl – Não sei se posso responder com justeza a essa pergunta. A primeira resposta que me ocorre é: o conforto relativo que se pode comprar (ou que se espera poder comprar) para suprir as carências do Estado no plano da vida privada não impede, mas poupa boa parte da classe média de amadurecer sua perspectiva de cidadania, que remete necessariamente à vida pública.
Quem acede à classe média planeja imediatamente conseguir pagar pela educação dos filhos, pela saúde, pela segurança na rua em que mora etc., e com isso, ufa! Deixar a política pra lá.
No Brasil, todos conhecem e denunciam a corrupção, a injustiça social, o desleixo dos políticos, mas numa perspectiva fatalista, do “este país não tem jeito mesmo...”, e não numa via de engajamento em projetos transformadores.”
Não sei qual é a opinião de vocês, mas, na minha, uma classe que age assim pagará mais IR que os bancos pelo resto da vida, por mais fatigada que esteja, conforme afirma o Sindifisco.

Nenhum comentário: