quinta-feira, 24 de maio de 2012

O fardo da felicidade

Pesquisas mostram como a busca incessante por ser feliz e a negação do sofrimento podem tornar as pessoas cada vez mais angustiadas
“Depois de devorar mais de 30 livros de autoajuda, a webdesigner Mariana Frioli, 28 anos, chegou a duas conclusões a respeito de sua busca por felicidade. A primeira, de que seria inviável ser feliz 100% do tempo, como sugeriam os títulos. A segunda, de que faltava à maioria das obras esse alerta. 'Quase tudo que li apresentava um mundo perfeito, que não correspondia à realidade e onde parecia ser possível ser boa em tudo o que se faz e feliz o tempo todo', diz. Depois dessa imersão, a webdesigner decidiu aposentar a coleção na estante e resolver por si só os momentos difíceis, sem fugir deles. Nem todos, porém, conseguem fazer como Mariana e tirar da cabeça a obsessão pelo bem estar incessante.
'É emblemático esse dogma contemporâneo de que pessoas de sucesso são aquelas que, independentemente de suas perdas, dores e fracassos, se mantêm, aparentemente, inabaláveis e demonstrando que a felicidade é sua companheira permanente', afirma a consultora Lêda Dutra, que estuda os valore humanos no mundo dos negócios. Como a pesquisadora, vários estudiosos engrossam o coro contra a tirania da felicidade, O xis da questão, bem definido pelo filósofo Pascal Bruckner, autor de 'A Euforia Perpétua' (Difel), é que não ser feliz se tornou imoral hoje em dia. 'Em vez de admitirmos que a felicidade é um evento indireto que nos chega ou não por meio de objetivos secundários, nós a consideramos um objetivo acessível imediatamente, por meio de receitas', escreveu Bruckner.
Tanta ânsia por uma alegria constante e eterna tem seus efeitos colaterais. O gerente administrativo Celso Riquena, 44 anos, bem sabe disso. 'Li livros de autoajuda para tentar ser mais feliz, mas, em um determinado momento, percebi que o efeito dessa busca era contrário: estava mais infeliz', afirma. O sentimento que Riquena experimentou é comum entre quem elege a felicidade como objetivo de vida, diz a pesquisadora June Gruber, do departamento de psicologia da Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Ela é coautora do artigo 'O lado negro da felicidade?', uma revisão científica sobre o tema, publicada no ano passado.
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Outro lado cruel do fetiche por ser feliz é não conseguir enxergar as sutis nuances do que significa felicidade para cada um. A administradora Claudia Cerullo, 42 anos, é exemplo disso. Ela é cotidianamente contestada por sua decisão de viver sozinha. 'Já ouvi várias vezes coitadinha da Claudia, não tem namorado', diz. 'Mas eu não quero me casar, sempre quis morar sozinha.' Some-se a essa perda da singularidade das formas de se viver a felicidade um sintoma ainda mais grave: a recusa ao sofrimento.  'A dor não tem sentido nesse contexto em que é obrigatório ser feliz. Ela não é vista como oportunidade de se repensar o que se quer na vida', diz o filósofo Paulo Vaz, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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'Aprendi que, do mesmo modo como os momentos felizes passam, os ruins também acabam', afirma a farmacêutica Jeanne Pilli, 46 anos. (...) 'A tristeza faz parte da vida', avalia Araceli Albino, coordenadora do Núcleo Brasileiro de Pesquisas Psicanalíticas e presidente do Sindicato dos Psicanalistas de São Paulo. (...)
Estes são alguns trechos da reportagem de Rachel Costa, publicada na edição de 23 de maio de 2012 da revista IstoÉ. Os grifos são da autora.
Depois de devorar mais de 30 livros de autoajuda, a webdesigner Mariana Frioli decidiu aposentar a coleção na estante e resolver por si só os momentos difíceis, sem fugir deles. Ou seja, ela decidiu se tornar uma "lifedesigner", pois é isso o que a vida requer de cada de um de nós: que saibamos não só aproveitar os momentos prazerosos, mas que também nos disponhamos a resolver os momentos difíceis, sem fugir deles, pois do mesmo modo como os momentos felizes passam, os ruins também acabam.
"O xis da questão, bem definido pelo filósofo Pascal Bruckner, autor de 'A Euforia Perpétua' (Difel), é que não ser feliz se tornou imoral hoje em dia. 'Em vez de admitirmos que a felicidade é um evento indireto que nos chega ou não ou não por meio de objetivos secundários, nós a consideramos um objetivo acessível imediatamente, por meio de receitas', escreveu Bruckner."
É muito estranho! Não ser feliz se tornou imoral, porém tudo com que nos envolvemos contribui, exatamente, para sermos infelizes. Nossos trabalhos são chatos, a tecnologia nos prende a eles em horário integral, vendemos férias para pagar dívidas ou por medo de perder o emprego (há milhões de desempregados), vivemos com medo de tudo e de todos, nossas opções de vida se mostraram insatisfatórias, temos pouquíssimo tempo para diversão, porém somos "obrigados" a ser felizes. E sendo assim, jamais admitiremos que a felicidade é um evento indireto que nos chega ou não por meio de objetivos secundários, pois nós a consideramos um objetivo acessível imediatamente, por meio de receitas', escreveu Bruckner. “Existem apenas duas coisas infinitas – o Universo e a estupidez humana. E não tenho tanta certeza quanto ao Universo”, escreveu Albert Einstein.
"'A dor não tem sentido nesse contexto em que é obrigatório ser feliz. Ela não é vista como oportunidade de se repensar o que se quer na vida', diz o filósofo Paulo Vaz, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. (...) 'A tristeza faz parte da vida', avalia Araceli Albino, coordenadora do Núcleo Brasileiro de Pesquisas Psicanalíticas e presidente do Sindicato dos Psicanalistas de São Paulo."
Vocês conseguem acreditar que jamais existiu alguém cuja vida tenha sido isenta de dores? Eu consigo. E ao conseguir, o que não tem sentido é esse contexto em que é obrigatório ser feliz. Tanta ânsia por uma alegria constante e eterna tem seus efeitos colaterais, diz o gerente administrativo Celso Riquena. (...) "Em um determinado momento, percebi que o efeito dessa busca era contrário: estava mais infeliz", acrescenta ele.
É a dor que possibilita a oportunidade de se repensar o que se quer na vida, diz o filósofo Paulo Vaz. "A tristeza faz parte da vida", avalia Araceli Albino, coordenadora do Núcleo Brasileiro de Pesquisas Psicanalíticas e presidente do Sindicato dos Psicanalistas de São Paulo. Pesquisas mostram como a busca incessante por ser feliz e a negação do sofrimento podem tornar as pessoas cada vez mais angustiadas, diz Rachel Costa no subtítulo da reportagem. E ao ver tanta gente dizendo alguma coisa, eu digo o seguinte: com a intenção de não tornar esta postagem mais um fardo para vocês, eu a termino aqui. Mas do fardo da felicidade eu não posso livrá-los, pois essa é uma tarefa que cabe a cada um. Portanto, o que posso é lhes dar uma sugestão: experimentem seguir o exemplo de Mariana Frioli e se tornem um (a) "lifedesigner".

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