segunda-feira, 30 de julho de 2012

Cresce grupo de apoio a comprador compulsivo

Problema se agrava no cenário de expansão do crédito; diagnóstico preciso depende da análise de especialistas
“No dia em que o contador de 31 anos não conseguiu mais pagar a comida nem o passe de ônibus, entendeu que tinha um problema. 'Cheguei ao fundo do poço em três anos. Devia cerca de R$ 35 mil quando ganhava R$ 1.000 por mês'. O contador, que não quer se identificar, participa de reuniões do Devedores Anônimos em São Paulo, um grupo de apoio a pessoas que sofrem de compulsão pelas compras (oniomania).
Desde 2010, três grupos desse tipo foram abertos na capital paulista, na Grande São Paulo e no Rio de Janeiro. Em São Paulo, o grupo mais antigo, que funciona nos Jardins desde 1998, aumentou o número de encontros de um para dois por semana desde janeiro. E clínicas privadas, como a Greenwood, começaram a tratar a doença junto com a dependência química.
Mais crédito
'Nos últimos cinco anos, percebemos, com a maior facilidade de obtenção de crédito, um aumento dos problemas dos compradores compulsivos', diz Marcelo Niel, especialista da área de psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo. 'É o mesmo fenômeno que ocorreu com a abertura dos bingos na cidade, quando registramos um aumento da dependência pelo jogo', acrescenta o especialista, que destaca a incidência do problema entre os mais pobres.
Com uma dívida de R$ 3 milhões com bancos, um empresário de 45 anos, que também não quer se identificar, teve de mudar completamente o estilo de vida para tentar superar a doença. 'Minha compulsão por comprar era tão forte que chegava a gastar R$ 400 em molho italiano no supermercado. Endividei minha empresa, minha família', diz, na sala da reunião do grupo de apoio nos Jardins.
Juan Pablo Roig e Monique Brandão, psicólogos da clínica Greenwood, dizem que, na patologia, a compra funciona como uma droga. Além disso, as pessoas que sofrem de oniomania costumam ter outros vícios, como as próprias drogas ou sexo.
Indicadores mostram um aumento preocupante da inadimplência no Brasil. Segundo o Banco Central, a taxa chegou a 8% em maio, o maior nível desde 1999. De acordo com levantamento da Serasa Experian, 60% dos inadimplentes têm dívidas superiores ao valor total da renda.
Nem todas as pessoas afogadas em contas, no entanto, sofrem de uma doença, mas há sinais - por exemplo, se os débitos são maiores que o patrimônio - que podem indicar um problema sério. 'Não é porque uma pessoa cria novas dívidas que ela tem a doença. Na maioria dos casos, os problemas são por falta de educação financeira', diz o consultor Marco Gazel."
Esta é a íntegra de uma reportagem de Maria Martin, publicada na edição de 23 de julho de 2012 do jornal Folha de S.Paulo.
Diante de tantas opiniões, quem se dispõe a manter um blog intitulado Lendo e opinando não resiste a emitir a sua. E considerando que as opiniões citadas na reportagem são atribuídas a profissionais, a minha é dada como analista de sistemas. Por que faço isto? Porque verdadeiros analistas de sistemas interpretam o que veem usando o raciocínio sistêmico. E o que vem a ser tal raciocínio? Em linhas gerais, ele pode ser definido como a ideia de que o todo é resultante da soma de todas as partes que o compõem e de todas as suas inter-relações. Sendo assim, sabendo encontrar as inter-relações, a minha opinião sobre a questão dos compradores compulsivos abrange todas as opiniões apresentadas na reportagem, e mais algumas coisas observadas por mim.
O consultor fala em falta educação financeira e, no meu entender, é ao contrariar uma regra básica de tal educação - não gastar mais do que se ganha - que começam os problemas de endividamento. Por viver em uma sociedade de consumo, onde o valor das pessoas é medido pelo que elas consomem, a maioria sai por aí comprando toda e qualquer coisa que lhe seja oferecida, independentemente de ter condições financeiras para comprá-la. E sem tais condições, além do produto ou serviço, ela compra também o dinheiro para pagá-lo. Ou seja, paga mais de uma vez por uma mesma coisa o que faz com que tenha cada vez menos recursos próprios para comprar a infinidade de coisas de que "precisa" para que seja "valorizada" nesta insana sociedade na qual sobrevivemos. E tendo menos recursos próprios ela recorre a mais financiamentos, que implicam em maior endividamento, que implica em mais financiamentos, que...  
Concordo com o consultor quando diz que a incidência do problema seja entre os mais pobres, mas, no meu entender, esses pobres são os pobres de espírito que acreditam em coisas que um raciocínio um pouco melhor rejeitaria. Ao acreditar em propagandas como "Não usa VISA, que coisa triste", saem por aí comprando tudo com cartões de crédito. Desprezando as reportagens que alertam que os cartões de crédito são os maiores causadores do crescente endividamento de incautos que os usam de maneira desregrada. E não percebendo que a facilidade de obtenção de crédito é diretamente proporcional a dificuldade que se tem na hora de quitá-lo.
O especialista da área de psiquiatria diz que é o mesmo fenômeno que ocorreu com a abertura dos bingos na cidade. Os psicólogos citados na reportagem dizem que, na patologia, a compra funciona como uma droga e que, além disso, as pessoas que sofrem de compulsão por compras costumam ter outros vícios, como as próprias drogas ou sexo. E o analista de sistemas, enxergando as relações existentes entre as coisas, afirma que o endividamento provocado pela compulsão por compras pode levar o endividado a desenvolver dependência de bingos e de outros jogos de azar numa tentativa de obter dinheiro para livrar-se de dívidas. E até a desenvolver outros vícios como as próprias drogas. Afinal, quem não vê como sair de um endividamento pode ficar bastante tentado a aceitar a proposta de fugir para uma "realidade" diferente daquela em que se encontra. Então, de relação em relação, o que começa como falta de educação financeira pode tornar-se uma doença. Na vida tudo está interligado.
Cresce grupo de apoio a comprador compulsivo, mas é preciso que tal grupo cresça rápido, pois o crescimento do grupo de compradores compulsivos cresce assustadoramente.

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