quinta-feira, 12 de julho de 2012

'Perdemos senso de compaixão', diz vencedor do Blue Planet Prize

Dupla que criou conceito de pegada ecológica critica ganância da humanidade e rumos que a Rio + 20 está tomando
“'Há 20 anos assumimos que poderíamos construir nosso caminho para a sustentabilidade. Essa foi a mensagem da Rio-92, mas desde então nada mudou. Só que o mundo está além do seu limite. Nós agora estamos usando mais produtos da natureza, mais peixes, mais florestas, mais solos do que o planeta consegue suprir. Estamos despejando mais lixo do que pode ser assimilado. Claramente estamos em um caminho insustentável'.
Com essa frase, o ecólogo canadense William Rees definiu o cenário crucial que os negociadores da Rio + 20 deveriam levar em conta ao decidir o chamado O Futuro que Queremos. Ele, no entanto, acredita que, pelo andar das discussões, o resultado da conferência acrescentará só mais uma 'camada no bolo' do desenvolvimento sustentável, mas 'não será o bolo inteiro'.
Rees e seu colega suíço Mathis Wackernagel receberam ontem o Blue Planet Prize, prêmio concedido pela fundação japonesa Asahi Glass em reconhecimento à excelência alcançada em pesquisas científicas e em sua aplicação na busca de soluções para problemas ambientais globais.
A dupla elaborou o conceito de pegada ecológica - ferramenta que mostra o impacto do consumo humano sobre os recursos naturais do planeta. Também foi premiado o biólogo Thomas Lovejoy, famoso por seus estudos sobre danos da fragmentação da Amazônia na biodiversidade.
Em entrevista ao Estado, Rees, que há mais de 35 anos trabalha com esse tema, lembrou que as grandes mudanças sociais estiveram sempre relacionadas a momentos de catástrofes. Mas que se não quisermos enfrentar outra, é urgente mudar os padrões de produção e consumo.
'Só que não queremos considerar a redistribuição da riqueza para resolver a pobreza, por exemplo. Porque isso significaria dividir, ter impostos justos, significaria o mundo corporativo contribuir mais com a sociedade', disse. No modelo corrente global, em que favorecemos a ganância e o individualismo e perdemos o senso de comunidade e a compaixão de uns pelos outros, é muito difícil persuadir as pessoas que a coisa mais importante é cooperar pelos interesses mútuos em vez de competir para crescer mais.
Wackernagel foi ácido em suas expectativas em relação à conferência. 'Acho que há uma má compreensão entre a maior parte das delegações de que se não houver acordo, então seus países não farão nada. Não temos um problema global, temos uma tempestade global. A questão é: seu barco está pronto para a tempestade? Não temos de ter um acordo que diga que temos de fazer isso. Um país não tem de consertar o buraco no seu barco só se os outros o fizerem. Tem de consertar para não afundar'."
Esta é a íntegra de uma reportagem de Giovana Girardi, publicada na edição de 18 de junho de 2012 do jornal O Estado de S.Paulo.
Infelizmente, as ácidas expectativas de Wackernagel em relação à conferência foram confirmadas. Até porque a probabilidade de que tal acontecesse era praticamente de 100%. Afinal, em uma sociedade cujo modelo corrente global favorece a ganância e o individualismo, onde o senso de comunidade e a compaixão de uns pelos outros foram perdidos, é muito difícil persuadir as pessoas que a coisa mais importante é cooperar pelos interesses mútuos em vez de competir para crescer mais.
Acho que há uma má compreensão entre a maior parte das delegações de que se não houver acordo, então seus países não farão nada, diz Wackernagel. Principalmente, os países dos poderosos. Em sua coluna aos sábados no jornal O Globo, Arnaldo Bloch, na edição de 23 de junho de 2012, diz o seguinte: “A Rio + 20 não passa de um teatrinho homologatório daquilo que só será real quando a água dos poderosos faltar”. Dá para discordar? No meu entender, não.
Em 26 de junho de 2012, este blog publicou uma postagem com o seguinte título: Tese americana de cada país por si sai fortalecida do Rio.
Portanto, creio que o que nos reste seja colocar em prática as palavras do vencedor do Blue Planet Prize usadas por Giovana Girardi para concluir sua reportagem: “Se o nosso barco não estiver pronto para a tempestade, nós não temos de ter um acordo que diga que temos de consertá-lo. Um país não tem de consertar o buraco no seu barco só se os outros o fizerem. Tem de consertá-lo para não afundar.” No meu entender, a afirmação de Wackernagel é válida não só para países, mas também para pessoas. Afinal são elas que formam os países, não é mesmo?

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