terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Para a ONU, PEC do Teto viola direitos humanos

Relatório aponta que medida é 'radical', não tem 'compaixão' e lembra que não há estudos comprovando eficácia a longo prazo
A proposta do governo Michel Temer de estabelecer um teto para gastos públicos foi mal avaliada e não passou pelo crivo das Nações Unidas. Os relatores da ONU alertam que a PEC 55 viola os direitos humanos e questionam a decisão de Temer de "congelar o gasto social no Brasil por 20 anos".
Na avaliação do relator especial da ONU para extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alston, a medida é "inteiramente incompatível com as obrigações de direitos humanos do Brasil". Sua posição foi apoiada pela relatora para Educação, Boly Barry.
"Num comunicado publicado ontem em Genebra, o representante da ONU alerta que o "efeito principal e inevitável da proposta de emenda constitucional elaborada para forçar um congelamento orçamentário como demonstração de prudência fiscal será o prejuízo dos mais pobres nas próximas décadas". A emenda, conhecida como PEC do Teto, deve ser votada pelo Senado, em segundo turno, no dia 13.
"Se adotada, essa emenda bloqueará gastos em níveis inadequados e rapidamente decrescentes em saúde, educação e segurança social, portanto, colocando toda uma geração futura em risco de receber proteção social muito abaixo dos níveis atuais", alertou.
"O especialista da ONU pede, por meio de carta aberta, que o governo realize debate público para, antes de sua votação, avaliar o impacto que a medida teria para "os setores mais pobres da sociedade e que identifique alternativas para atingir os objetivos da austeridade".
Há cerca de uma década, Alston também criticou duramente o comportamento da polícia brasileira, levando o Itamaraty, sob o governo de Lula, a criticá-lo. Agora, seu alvo são os gastos sociais.
"Uma coisa é certa", disse Alston. "É completamente inapropriado congelar somente o gasto social e atar as mãos de todos os próximos governos por duas décadas. Se essa emenda for adotada, colocará o Brasil em uma categoria única em matéria de retrocesso social."
No comunicado, o relator alerta que a proposta é feita por um governo que "chegou ao poder depois de um impeachment e que, portanto, jamais apresentou seu programa a um eleitorado". Segundo diz, isso levantaria ainda maiores preocupações de a proposta "amarrar as mãos de futuros governantes".
Alston admite que o Brasil sofre sua "mais grave recessão em décadas", mas alerta que a PEC "terá um impacto severo para os mais pobres". Ele chamou a medida de "radical, desprovida de toda nuance e compaixão". Segundo disse, "vai atingir os brasileiros mais pores e mais vulneráveis". Além disso, lembrou que "evidentemente viola as obrigações do Brasil" com o Pacto Internacional de Direitos humanos, ratificado em 1992. Em determinado momento, Alston elogiou o combate à pobreza nos últimos anos.
"Estudos econômicos internacionais, incluindo pesquisas do FMI, mostram que a consolidação fiscal tipicamente tem efeitos de curto prazo, reduzindo a renda, aumentando o desemprego e a desigualdade. E, a longo prazo, não existe evidência empírica que sugira que essas medidas alcançarão os objetivos sugeridos pelo governo," completou o relator.
Esta é a íntegra de uma reportagem de Jamil Chade publicada na edição de 10 de dezembro de 2016 do jornal O Estado de S. Paulo.
Uma proposta de emenda constitucional feita por um governo que "chegou ao poder depois de um impeachment e que, portanto, jamais apresentou seu programa a um eleitorado; que viola os direitos humanos e coloca o Brasil em uma categoria única em matéria de retrocesso social", segundo o relator especial da ONU. Que proposta é essa?! Que país é esse?!
Uma proposta de emenda constitucional composta por medidas para as quais "não existe evidência empírica de que elas alcançarão os objetivos sugeridos pelo governo", ainda segundo o relator especial da ONU.
Uma proposta de emenda constitucional aprovada por um bando de deputados e de senadores envolvidos com denúncias de corrupção. Que país é esse que permite que indivíduos nessa condição emendem a constituição?!
Uma proposta de emenda constitucional contra a qual a população foi incapaz de protestar, pois, neste país, protestos "populares" só acontecem quando insuflados por meios de comunicação a serviço dos que se consideram donos do país, e, obviamente, contra coisas que não lhes convenham. Que proposta é essa?! É uma proposta que me faz lembrar o nome de um filme: Proposta indecente. Que população é essa que não protesta contra ela?!
Enfim, uma proposta de emenda constitucional que, se a população tivesse um mínimo de consciência, levaria a esquecê-la, de uma vez por todas, aquele surrado e infeliz refrão: "Eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor". Francamente, que orgulho é esse?!

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