Enquanto o desemprego no Brasil se aproxima de 12% em meio a dois anos seguidos de encolhimento da economia, há indústrias brasileiras abrindo novas fábricas e criando milhares de novos empregos diretos. Esses investimentos, no entanto, são realizados no Paraguai, país que quer aproveitar a proximidade com o Brasil para ser uma plataforma de produção barata e livre de burocracia para o abastecimento do mercado de consumo brasileiro.A estratégia de atrair investimentos e empregos ao abrir da mão da cobrança de impostos tem dado resultado. A lei da maquila, que garante o pagamento de apenas 1% de tributo às companhias que abrirem fábricas no Paraguai e exportarem 100% da produção, existe desde 1997. Outras vantagens incluem gastos menores com mão de obra e energia e energia elétrica.
(...) A transformação do Paraguai em uma "China da América do Sul" é um projeto do presidente Horacio Cartes, no poder há três anos. A prioridade de Cartes – que também é um dos empresários paraguaios mais ricos – é gerar empregos para a mão de obra paraguaia. Mais de 70% da população de 6,8 milhões de habitantes tem menos de 30 anos e boa parte ainda atua na informalidade.
A estratégia é elogiada pelo setor produtivo. Cartes, porém, enfrenta críticas por ter abandonado programas sociais, em especial no interior. Durante a passagem da reportagem do Estado por Assunção houve um protesto contra o atual presidente – com direito a cartazes "Fora Cartes".
Estes são alguns trechos de uma reportagem de Fernando
Scheller, publicada na edição de 2 de janeiro de 2017 do jornal O Estado de S. Paulo.
Em busca de custos
menores, empresas brasileiras abrem fábricas no Paraguai, eis o título da
reportagem. Título que provoca em mim algumas indagações. O que significa ser
uma empresa brasileira? Ou melhor, o que define a nacionalidade de uma empresa?
O país onde ela está situada? A nacionalidade de seus empregados? A
nacionalidade daqueles a quem a empresa pertence? Aliás, a quem pertence uma
empresa? Para responder à última indagação segue uma passagem do livro Globalização: As consequências humanas,
de autoria de Zygmunt Bauman, publicado
pela Jorge Zahar Editor, em 1999.
"A companhia pertence às pessoas que nela investem – não aos seus empregados, fornecedores ou à localidade em que se situa.". Foi assim que Albert J. Dunlap, o célebre "racionalizador" da empresa moderna (um dépeceur – um "açougueiro", um "esquartejador" – na maliciosa, mas precisa definição do sociólogo Denis Duclos, do Centro Nacional de Pesquisas Sociais da França resumiu seu credo no autocongratulante relato de suas atividades que a Times Books publicou para esclarecimento e edificação de todos os que buscam o progresso econômico.
(...) é a eles e apenas a eles que "pertence" a companhia. Cabe a eles portanto mover a companhia para onde quer que percebam ou prevejam uma chance de dividendos mais elevados, deixando a todos os demais – presos como são à localidade – a tarefa de lamber as feridas, de consertar o dano e se livrar do lixo. A companhia é livre para se mudar, mas as consequências da mudança estão fadadas a permanecer.
É a eles e apenas a eles - os investidores - que
"pertence" a companhia. É a eles e apenas a eles – os governantes
(sic) – que cabe abrir as portas do país a companhias que nele se instalem, e
nele permaneçam enquanto lhes interessar, com a finalidade de transformar
países em meras fábricas e pessoas em simples escravos. Ficaram chocados com a referência
à escravidão? Então leiam o próximo parágrafo.
(...) A transformação do Paraguai em uma "China da América do Sul" é um projeto do presidente Horacio Cartes, no poder há três anos. A prioridade de Cartes – que também é um dos empresários paraguaios mais ricos – é gerar empregos para a mão de obra paraguaia. Mais de 70% da população de 6,8 milhões de habitantes tem menos de 30 anos e boa parte ainda atua na informalidade."
"Mais de 70% da população de 6,8 milhões
de habitantes tem menos de 30 anos e boa parte ainda atua na informalidade.",
diz Fernando Scheller em sua reportagem. O que vocês entendem por "ainda atua
na informalidade"? O que vocês acreditam que virá após a informalidade? A
formalização, a uberização ou a escravidão?
O que é uberização? É o trabalho em migalhas.
Onde encontrei esta definição? Em um texto intitulado A uberização da vida. Um texto do filósofo João de Fernandes
Teixeira publicado na edição nº 120 da revista Filosofia, publicada pela editora Escala. Um texto que vale a pena
ler. O que virá após a uberização? A escravidão. Afinal, em um mundo onde a
vida da população passou a depender da existência de investidores que tenham
algum interesse monetário em sua preservação, dá para duvidar que estamos caminhando
rumo à escravidão?
É a eles e apenas a eles – os candidatos a
futuros escravos - que "pertence" o esforço para enxergar
corretamente a realidade que os cerca, pois enxergá-la é condição sine que non para enxergar também que
sem a sua participação efetiva jamais qualquer realidade será mudada a seu
favor. Mundo
é ignorante sobre realidade, diz pesquisa, eis o título da postagem anterior
deste blog.
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